Continuando a sequência de casos de repercussão, vamos falar de um caso que ocorreu em 28 de novembro de 2018, em um hipermercado da região metropolitana de São Paulo, no município de Osasco. Um cão sem raça definida, que ficava nos arredores deste supermercado, ficou conhecido como Manchinha, devido às manchas pretas em sua pelagem. Machinha, foi brutalmente agredida e exterminada, sendo ferida por objetos metálicos e indícios de ter sido intoxicada intencionalmente por um funcionário que atuava na vigilância do hipermercado.
O caso ganhou repercussão nacional e internacional rapidamente, graças às redes sociais, que compartilharam incansavelmente a imagem da cadelinha e clamavam por Justiça em prol deste crime horrendo.
Após as agressões, o animal foi levado ao Centro de Zoonoses do município ainda em vida, pois após as agressões apresentava sangramento. Manchinha veio a óbito em seguida.
Um caso extremamente cruel e duro de contar, que vale também uma longa reflexão sob o ponto de vista ético, moral e a forma como os animais não humanos são tratados. Sob o ponto de vista pericial múltiplas falhas impedem uma avaliação precisa dos fatos ocorridos com relação ao tipo de violência utilizada e lesões provocadas no animal.
O cadáver do animal não foi submetido a um exame necroscópico, e nem mesmo avaliação de material para confirmação de intoxicação, pontos importantes para um processo investigativo. Estes exames periciais em casos criminais devem ser realizados pelo perito oficial criminal, aquele concursado, e para sua realização deve haver a solicitação de uma autoridade, como no caso o Delegado. Fica evidente que neste caso as condutas periciais deixaram a desejar.
Ainda assim, devido a grande repercussão, o caso foi denunciado e acolhido pelo Ministério Público de São Paulo e que culminou em uma investigação através dos elementos disponíveis (vídeos amadores da tortura ao animal, depoimento de testemunhas e relatos dos veterinários que atenderam Manchinha), tendo como resolução em março de 2019 com um Termo de Compromisso para pagamento de uma multa no valor de um milhão de reais para o Município reverter em projetos e ONG’s que atuam na causa animal. Além disso o indivídio que cometeu o crime responde por maus-tratos aos animais como previsto no art. 32 da Lei 9.605, Lei de Crimes Ambientais.
Certamente um caso que teve resolução graças à mobilização em redes sociais e protestos realizados em todo o país, inclusive com apoio de influenciadores e artistas. Afinal de contas, quantas Manchinhas já foram vítimas de violência e nada foi feito ?
Por essa razão que este caso se tornou marcante, pois mostra o poder da sociedade em defesa do Direito Animal e da aplicação da Justiça em prol dos mesmos. Ainda que a pena e a investigação esteja longe do ideal, podemos considerar que a repercussão do caso foi crucial para respostas do poder público.
SOBRE A AUTORA
Dra. Tália Missen Tremori
Médica Veterinária, mestre e doutora pela Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (campus Botucatu)
Doutora pela Universidad de Salamanca, Espanha
Membro da Comissão Técnica de Medicina Veterinária Legal do CRMV-SP
Coordenadora no Brasil e assessora de comunicação da WAWFE (Worldwide Association of Woman Forensic Experts)
Membro da "Asociación Iberoamericana de Medicina y Ciencias Veterinarias Forenses"
Perita Judicial, TJSP, TRF1, TRF3 e AJG
Diretora Técnica e sócia do Forensic Med Vet
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