No sexto semestre de jornalismo da PUC-SP, todos os estudantes precisam pensar em seus projetos de TCC para que no período seguinte iniciem as pesquisas, entrevistas e apurações. Eu já tinha interesse em fazer meu trabalho de conclusão de curso voltado para a medicina veterinária, quando escutei pela primeira vez sobre a "Teoria do Elo", em uma mesa de jantar com várias estudantes da área.
O termo me chamou atenção e questionei. A resposta foi que "em um ambiente familiar, se um dos membros sofre qualquer tipo de violência, os outros também podem estar sofrendo ou podem ser os próximos, isso vale também para membros não humanos (animais domésticos)".
Não satisfeita com a pouca informação, fui atrás de estudos sobre o "Elo". A Teoria, também conhecida como Teoria do Link, foi desenvolvida através de pesquisas e estudos desde a década de 70, principalmente na América do Norte. Até mesmo o Departamento Federal de Investigação (FBI) é cauteloso com quem é cruel com animais.
O órgão começou a quantificar os maus-tratos contra animais como um fator nos perfis criminais, no final dos anos 1970. A inclusão desse ato como um comportamento de alerta, ocorreu após uma investigação. Foram entrevistados 36 assassinos seriais na prisão, 36% deles haviam matado ou torturado animais e 46% foram cruéis com bichos, ainda na adolescência, mais uma vez comprovando que quando alguém violenta animais, tende a expandir sua agressividade, ou atos piores, para outras pessoas.
A diferença entre os Estados Unidos e o Brasil, é que lá os animais são considerados vítimas do crime, já no nosso país, são considerados objetos do crime, ou seja, objeto no qual recai a conduta criminosa. "Isso acontece porque o sistema jurídico nacional não evoluiu suficientemente para reconhecer os animais como sujeitos de direito”, explica Robis Francisco Nassaro, autor do livro "Maus tratos aos animais e violência contra as pessoas". Então quando alguém violenta um animal aqui, ainda não há certa relevância para o caso e em consequência a medicina veterinária, área fundamental para a quebra desse ciclo de violência, fica em desfoque.
Segundo o artigo 5o da Lei No 5.517, de 23 de outubro de 1968, é ato privativo do médico veterinário fazer qualquer assistência técnica e sanitária aos animais sob qualquer forma e o planejamento e a execução da defesa sanitária animal, entre outras funções. Ou seja, nenhum outro profissional pode diagnosticar maus-tratos, mas diversas vezes a lei é quebrada durante fiscalizações.
O que acontece, e os veículos de comunicação comprovam isso, é que grande parte das fiscalizações ou investigações de denúncia de maus-tratos ou negligência são feitas por policiais militares ou civis que, por não serem da área veterinária, não sabem concluir (diagnosticar) o que realmente acontece com aquele animal. Também muitas vezes não têm conhecimento sobre a Teoria do Elo e pode ser que as providências para finalizar aquele caso não sejam as melhores, como tirar o animal daquela situação, mas não observar se outras pessoas também estão em perigo.
Há diversas razões para a polícia não conhecer o "Elo", mas penso que um dos motivos é a falta de informação da mídia, que poderia abordar esse assunto com mais clareza. Explico com um exemplo: em setembro, uma bailarina do programa do Ratinho denunciou seu ex-namorado por agressões. Além da violência física, ela sofreu violência psicológica, porque o agressor sumiu com seus passarinhos e ninguém sabe o que ele seria capaz de fazer com os bichos, principalmente para atingir a vítima ou calá-la que, por medo do que aconteceria com seus animais, não denunciaria.
Os veículos de comunicação enfatizaram tanto a violência contra a mulher - algo importante -, mas esqueceram de mencionar o elo. Para uma breve notícia, a sucinta sinalização de que há pesquisas que comprovam que quando uma pessoa é violenta com animais, tende a expandir sua agressividade para outros seres, seria fundamental e passaria a informação necessária. Agora, matérias explicativas e aprofundadas sobre o assunto, que notificam a importância das parcerias entre áreas, policiais trabalhando em conjunto com médicos veterinários, são de extrema importância. Por essa razão escolhi fazer meu TCC sobre a Teoria do Elo, uma vez que são poucos os jornalistas e cidadãos que sabem sobre a conexão.
Com as entrevistas para o meu trabalho, percebi também que apenas alguns médicos veterinários têm conhecimento sobre o "Elo" e sobre a importância da denúncia de maus-tratos. Vocês são os únicos profissionais que podem avaliar que um animal está em situação de violência e a denúncia de vocês pode salvar tanto a vida do bicho, como a de outros membros da família e quebrar o ciclo da violência. Compartilhem a informação, criem cursos sobre o assunto, ensinem a denunciar de forma segura e espalhem a importância de vocês.
Nesse artigo falei brevemente sobre a Teoria do Elo, mas há diversos assuntos a serem explorados, por exemplo, a violência contra animal cometida por crianças e adolescentes como sinalizador de um ambiente familiar caótico, e muito mais. Para aqueles que querem aprender mais sobre o assunto, recomendo começar pelas pesquisas dos autores Phil Arkow e Frank Ascione. Juntos e com conhecimento é possível salvar mais vidas.
Sobre a autora
Bruna Galati | brunagalati@gmail.com
● Estudante de jornalismo da PUC-SP. Formação em julho de 2022.
● Estagiou para o site da TV Cultura e voluntariou para Agência de Notícias de Direitos Animais.
● Atualmente é jornalista do Portal Startupi
REFERÊNCIAS
ASCIONE, F. R e ARKOW, P.: Child Abuse, Domestic Violence, and Animal Abuse
NASSARO, R. F.: Maus tratos aos animais e violência contra as pessoas
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